Para citar esse texto:
PAES, Luísa. A GUERRA DE INDEPENDÊNCIA ARGELINA. Debates Pós Coloniais e Decoloniais, 16 nov 2020. Disponível em: https://decoloniais.com/a-guerra-de-independencia-argelina/ Acesso em: *inserir data*
A luta anti-colonial argelina transcendeu as fronteiras de seu país, inspirando revoluções que viriam a seguir no continente africano, assim como grandes pensadores do pós-colonialismo. Crucial para a compreensão acerca da política africana após a metade do século XX, a Revolução Argelina ocorre entre os anos 1954 e 1962, resultando na conquista da independência da Argélia depois de 132 anos de dominação colonial francesa.
A dominação territorial da França sob o país que hoje conhecemos como Argélia fabricou fronteiras e conferiu a esta uma condição diferenciada das demais colônias. A Argélia seria tratada como um prolongamento da metrópole em terras africanas, que, sob a visão colonialista, deveria transformar-se para replicar as características francesas, iniciando um longo período de epistemicídio local.
O país possuía sua maioria populacional muçulmana, mas, a discriminação religiosa viria a ser uma importante característica do governo na colônia. Foi determinado por lei que religiosos muçulmanos não pudessem se reunir publicamente, nem ao menos sair de suas residências sem autorização, também, o francês foi determinado como a nova língua oficial do país, proibindo a disseminação do aprendizado na língua árabe, agora estabelecida como estrangeira. Para a atender a condição de cidadão sob o governo francês, era imprescindível a renúncia da fé islâmica.
Em meados da década de 1930, o nacionalismo argelino começa a aflorar nas ideias de jovens estudantes, os quais completaram a sua formação na metrópole, levando à colônia reivindicações de melhorias sociais. Durante a Segunda Guerra Mundial, com as intermináveis contestações do povo argelino ao domínio francês, o país havia prometido conceder a independência exigida, entretanto, em 1945 a França recusou-se a cumprir sua parte do acordo, o que viria a provocar ainda maiores protestos nas principais cidades argelinas.
As manifestações populares começaram pacificamente, porém encontraram forte repressão francesa. No ano seguinte, a Constituição Francesa permitia, finalmente, a representação de colonos no Parlamento, mas, ao contrário do que se esperava, nas eleições que se seguiram, nos anos de 1948 e 1951, candidatos nacionalistas das colônias foram impedidos de tomar posse. Desse modo, insurgiram novos protestos dentro da Argélia, combatidos, novamente, de modo violento pela forças francesas presentes, o que viria a fazer com que a luta pela independência se tornasse uma violenta guerrilha que perdurariam por anos.
A guerra se desdobrou em um complexo conflito caracterizado pelo uso de tortura e violência generalizada, entre dois grupos antagônicos principais: a Front de Libération Nationale (FLN), partido político composto por nacionalistas argelinos que possuía uma ala armada, o chamado Armée de Libération Nationale, em oposição às Forças Armadas francesas. A FNL buscava pressionar a comunidade internacional, a fim de chamar atenção para os acontecimentos no país, também objetivando alcançar uma mobilidade de solidariedade árabe além de suas próprias fronteiras. O movimento estimulava a luta anti-imperialista revolucionária em outros países, para um alinhamento à causa nacionalista argelina.
Foto: Embassy of Algeria
A guerra não parecia encontrar seu fim, ao passo que o mundo acompanhava as suas repercussões. A Organização das Nações Unidas reconhece o direito de independência da Argélia pela Resolução n° 1573 (XV), da Assembléia Geral, em dezembro de 1960 e, posteriormente viria a discutir e produzir uma nova resolução, Resolução 1924 (XVI), em dezembro de 1961 reiterando tal posição, levando o presidente francês Charles de Gaulle a iniciar as negociações com a FNL. Em 1962, após a condução de um referendo no território argelino, foi assinado o Acordo de Évian, estabelecendo a independência da Argélia. Estima-se que ao menos um terço da população argelina teria sido assassinada desde a invasão do território em 1830.
Frantz Fanon, um dos mais influentes pensadores do século XX sobre a temática da descolonização, se viu inspirado diante do cenário político o qual vivenciou na Argélia. O martinicano foi enviado para o país para servir o exército francês como médico psiquiatra durante a Segunda Guerra Mundial e, durante a sua estadia, testemunhou a luta de libertação argelina, se aliando ao nacionalismo argelino. Fanon viria a dedicar sua vida acadêmica a analisar as consequências da colonização, tanto para o colonizador assim como para o colonizado, incorporando a perspectiva psicológica de seu processo.
A Revolução Argelina coincide com a vigência das perspectivas do pan-africanismo e do pan-arabismo, aproximando as duas vertentes e, demonstrando seu encontro. O país africano de maioria populacional muçulmana foi crucial para o início dos debates acerca da união do um continente dividido pelas mazelas colonialistas.