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LITERATURA INFANTIL: DIVERSA, ANTIRRACISTA E DECOLONIAL

Para citar esse texto:

LARANJEIRAS, L. H. LITERATURA INFANTIL: DIVERSA, ANTIRRACISTA E DECOLONIAL. Debates Pós Coloniais e Decoloniais, 18 abr 2020. Disponível em: https://decoloniais.com/dia-nacional-do-livro-infantil/  Acesso em: *inserir data*

Sabemos que o hábito de leitura é um forte instrumento para despertar a mente, apurar o senso crítico, ampliar o conhecimento, enriquecer o vocabulário e aguçar a criatividade. Tamanha é a importância da leitura para o desenvolvimento da criança que, em 2002, em homenagem ao aniversário de Monteiro Lobato, o dia 18 de abril foi elencado como o Dia Nacional do Livro Infantil, em dedicação ao fomento da leitura e da escolarização básica.

Nascido em 1882, no fim do período da escravização, Monteiro Lobato é considerado um dos mais influentes escritores da literatura brasileira do século XX, suas histórias e personagens infanto-juvenis, como “O Pica-pau Amarelo” (1939) e “O Saci” (1921), são lidas e relidas até hoje em todos os cantos do país. Acontece que de uma das maiores vozes da literatura infantil, ecoa também ideias racistas e eugenistas.

Em “Raça Pura: uma História da Eugenia no Brasil e no Mundo”, a historiadora Pietra Diwan cita uma carta de Monteiro Lobato à Renato Kehl, um grande sanitarista e entusiasta da eugenia, na qual o escritor brasileiro revela indícios de que utilizou de sua literatura para, abstrusamente, difundir pensamentos eugenistas já não tão bem aceitos na época.

“É um processo indireto de fazer eugenia, e os processos indiretos, no Brasil, work muito mais eficientemente” – Monteiro Lobato, setembro de 1930.   

Neste ponto, concordamos com Lobato. A colonialidade, como bem nos alertou Aníbal Quijano (2005), é tida como a continuidade das práticas de dominação colonial mesmo após o fim da colonização. Isso ocorre por meio de uma estrutura tão complexa que perpassa e envolve os níveis de poder, do saber e do ser, que acaba sendo naturalmente difundida e difícil de ser superada. No entanto, se a educação pode – e é – utilizada como um instrumento de dominação e subordinação para reforçar e validar a suposta supremacia do colonizador, ela também pode – e deve – ser utilizada em função da emancipação do colonizado.

Jamais saberemos se, em 1933, quando escreveu “Caçadas de Pedrinho”, Lobato imaginava que sua obra um dia seria objeto de um mandado de segurança acionado ao Supremo Tribunal Federal em que se discutia a sua retirada da lista de livros obrigatórios das escolas públicas, mas o fato é que toda violência que um dia foi naturalizada já não passa mais despercebida neste século. Em 2020, uma nova versão do livro de Monteiro Lobato foi lançada, assinada por Maurício de Sousa e Regina Zilberman, sem expressões preconceituosas e racistas, como “carne negra”, “prematura” e “macaca de carvão” para se referir à Anastácia.

É neste contexto de revisitação do nosso passado e de nossa literatura, que propomos não uma censura à Monteiro Lobato ou qualquer outro escritor que, por ventura, possa ter contribuído para a perpetuação de discursos que privilegiam condutas de dominação e opressão, mas sim a divulgação de autores que valorizem a pluralidade dos traços da história de um povo que ainda não se libertou completamente de suas amarras de exploração, colonização e silenciamento. Celebremos uma literatura infantil diversa, antirracista e decolonial!

KUAMI, por Cidinha da Silva

Kuami é um romance para expandir nosso universo de afetos ao enfocar amor versus ódio. Amor versus prisão. Amor como exercício de liberdade. Amor numa família estendida. Amor traduzido em ação. Esse é o cenário em que se desenvolvem as aventuras de Janaína – uma sereia – e Kuami – um pequeno elefante africano – e suas famílias, entre o encontro do rio com o mar e a floresta amazônica.

YAKUBA, por Thierry Dedieu

Amanhece na savana africana. E, para o jovem Yakuba, é um dia especial: ele está prestes a se tornar um guerreiro. Para provar sua coragem, precisa, no entanto, enfrentar um leão. Sob o sol escaldante, o menino-homem caminha, com medo, e finalmente encontra o inimigo. Ansioso, ele corre para lutar, mas é paralisado pelo olhar do grande felino, que está ferido. Agora Yakuba deve decidir: ou mata o animal, e ganha o respeito da tribo, ou o poupa, e se torna homem a seus próprios olhos.

AMORAS, por Emicida

Em seu primeiro livro infantil, Emicida conta uma história cheia de simplicidade e poesia, que mostra a importância de nos reconhecermos nos pequenos detalhes do mundo. Na música “Amoras”, Emicida canta: “Que a doçura das frutinhas sabor acalanto/ Fez a criança sozinha alcançar a conclusão/ Papai que bom, porque eu sou pretinha também”. E é a partir desse rap que um dos artistas brasileiros mais influentes da atualidade cria seu primeiro livro infantil e mostra, através de seu texto e das ilustrações de Aldo Fabrini, a importância de nos reconhecermos no mundo e nos orgulharmos de quem somos — desde criança e para sempre. “Um livro que rega as crianças com o olhar cristalino de quem sonha plantar primaveras para colher o fruto doce da humanidade.” — Sérgio Vaz

KABÁ DAREBU, por Daniel Munduruku

“Nossos pais nos ensinam a fazer silêncio para ouvir os sons da natureza; nos ensinam a olhar, conversar e ouvir o que o rio tem para nos contar; nos ensinam a olhar os voos dos pássaros para ouvir notícias do céu; nos ensinam a contemplar a noite, a lua, as estrelas… ” Kabá Darebu é um menino-índio que nos conta, com sabedoria e poesia, o jeito de ser de sua gente, os Munduruku.

O PEQUENO PRÍNCIPE PRETO, por Rodrigo França

Em um minúsculo planeta, vive o Pequeno Príncipe Preto. Além dele, existe apenas uma árvore Baobá, sua única companheira. Quando chegam as ventanias, o menino viaja por diferentes planetas, espalhando o amor e a empatia. O texto é originalmente uma peça infantil que já rodou o país inteiro. Agora, Rodrigo França traz essa delicada história no formato de conto, presenteando o jovem leitor com uma narrativa que fala da importância de valorizarmos quem somos e de onde viemos – além de nos mostrar a força de termos laços de carinho e afeto. Afinal, como diz o Pequeno Príncipe Preto, juntos e juntas todos ganhamos.

MEU CRESPO É DE RAINHA, por Bell Hooks

Publicado originalmente em 1999, em forma de poema rimado e ilustrado, esta delicada obra chega ao país pelo selo Boitatá, apresentando às meninas brasileiras diferentes penteados e cortes de cabelo de forma positiva, alegre e elogiosa. Um livro para ser lido em voz alta, indicado para crianças a partir de três anos de idade – e também mães, irmãs, tias e avós – se orgulharem de quem são e de seu cabelo ‘macio como algodão’ e ‘gostoso de brincar’. Hoje em dia, é sabido que incontáveis mulheres, incluindo meninas muito novas, sofrem tentando se encaixar em padrões inalcançáveis de beleza, de problemas que podem incluir desde questões de insegurança e baixa autoestima até distúrbios mais sérios, como anorexia, depressão e mesmo tentativas de mutilação ou suicídio. Para as garotas negras, o peso pode ser ainda maior pela falta de representatividade na mídia e na cultura popular e pelo excesso de referências eurocêntricas, de pele clara e cabelos lisos. Nesse sentido, “Meu crespo é de rainha” é um livro que enaltece a beleza dos fenótipos negros, exaltando penteados e texturas afro, serve de referência à garota que se vê ali representada e admirada.

Leandro Laranjeiras

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